Suave e indelével como veludo vermelho. O vislumbre de pétalas de uma rosa despontadas ao chão, que em sua delicada constituição e aparente torpor, evocam o desejo por contato; o tipo de toque capaz de condensar as nuances perceptivas de todos os sentidos do corpo, num estado suspenso ao mesmo tempo de contemplação e envolvimento. No precipício de seus espinhos, tecidos se rompem, feridas se abrem e, entre os intervalos de dor, encontra-se a ânsia por proteção.
Ao atravessar a resistência dos espinhos que nos cercam, somos acalentados pela ambiência terna das obras que constituem “Queerência”, segunda exposição individual do artista baiano Brendon Reis na Galeria Inox. Conduzidos à uma dimensão que explora a intimidade, a sutileza, refúgios e o acolhimento como um santuário encontrado no interpessoal, nas conexões platônicas, amorosas e especialmente nos relacionamentos afetivos queer.
Em seu cerne mais profundo, observamos a emblemática e inédita pintura “As Fofoqueiras (Trans em Ouro)” enquanto prenúncio deste universo em particular. Queerência é a junção das palavras queer e querencia (substantivo feminino, amor ou amizade) que em sua origem etimológica espanhola denota a ação de amar ou querer bem, um local que se ama. Os temas descritos convergem o olhar espectador e o gestual enquanto subterfúgios, sublinhando dualidades que estão presentes na percepção do que é inerentemente marginalizado. Sua relação se estabelece em direto diálogo com as pinturas “Tríade”, produzidas em 2024. Nesta nova série, encontramos questões paralelas entre gênero, identidade e sexualidade. Permeadas por uma tensão feita de seda, o tear de um invólucro como a teia de uma aranha, que evoca sensações de inquietação e estranheza, o receio de ter seu mistério revelado.
Enquanto “As Fofoqueiras” e “Tríade” denunciam o olhar, Brendon rememora o tato e a querência por toque através de suas esculturas e pinturas de casais homoafetivos, retratados em uma postura que evidencia o orgulho, afirmação e reconhecimento da comunidade LGBTQIA+, em rompimento aos receios anteriormente vividos. Num momento posterior à solitude e isolamento, retornamos à calma azulada, desta vez envolvida e moldada por uma aura afetuosa e idílica. Nas esculturas, com suas padronagens esféricas que remetem aos grafismos pertencentes à rituais de cura e transmutação iorubá, observamos seus olhos fechados em estado de plenitude, como se envelopadas finalmente por este querer tão longínquo, descansadas e plenamente pertencentes à seus iguais em corpo e espírito.
Nina Satie.